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Paul Ehrenreich
O olhar de um etnógrafo do séc. XIX
Paul Max Alexander Ehrenreich nasceu em Berlim em 1855. Doutor em medicina e filosofia, dedicou-se também aos estudos de etnologia e antropologia. Realizou viagens de estudos à Índia e ao Egito, mas foi no Brasil que suas pesquisas adquiriram maior notoriedade e relevância científica.
Viajou para a província do Espírito Santo entre 1884 e 1885 para conhecer os Botocudo* no Rio Doce. Em 1887, com 22 anos, viajou pela primeira vez à Amazônia como responsável pela antropometria da segunda expedição ao Xingu, liderada Karl von den Steinen, que cita um dos momentos de encontro dos indíos com a câmera fotográfica:
Somente após muita dificuldade o grupo de mulheres se posicionou. As mulheres deixaram se arrumar e por em ordem, Paul Ehrenreich estava pronto para expor a chapa. Quando elas descobriram seu reflexo na objetiva, partiram para cima da câmera para se ver mais de perto. As muitas agruras de um fotógrafo! (STEINEN, 1897 apud VALENTIN, 2012, p.47-48)
Acompanhado pelo geógrafo alemão Peter Vogel, Ehrenreich separa-se de Von den Steinen e visita onze povoados e sete tribos diferentes, realizando medições corporais dos indígenas encontrados. Nesse mesmo ano também tornou-se sócio-correspondente da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro.
Em 1888 realiza, desta vez na condição de líder, sua segunda e última expedição à Amazônia. Seguindo o roteiro recomendado por Von den Steinen, Ehrenreich desce o Rio Araguaia desde as cabeceiras do Planalto Central até à Foz do Tocantins, onde entra em contato com os índios Karajá. O etnólogo ainda percorre nesta expedição os rio Amazonas e Purus, conhecendo os Apurinã, os Paumari e os Jamamadi. Ao contrário das ocasiões anteriores, não estende sua viagem por achar que os índios da região se encontravam muito “aculturados” pelo contato forçado com os seringueiros.
O historiador da fotografia Pedro Karp Vásquez localizou em suas pesquisas na coleção do Institut für Länderkunde, de Leipizig, uma série de 23 imagens retratando os diferentes grupos indígenas brasileiros pesquisados pelo etnólogo alemão: “Tais imagens, de enfoque eminentemente antropológico, são deficientes do ponto de vista técnico, porém valiosas em termos históricos em virtude da escassez de registros fotográficos dos índios brasileiros datados do século XIX” (KARP VASQUÉZ, 2000, p. 184). São basicamente retratos onde procura dar visibilidade principalmente à constituição física e aos ornamentos dos indígenas fotografados, entre eles membros das etnias Botocudos, Jamamadi, Paumari, Karajás, Mehinako e Baikari.
Segundo o pesquisador João Meirelles Filho, para Ehrenreich:
(…) a fotografia desempenhará importante papel, uma vez que registra povos atualmente extintos ou aculturados”. Essa afirmação encontra respaldo nas palavras do antropólogo Egon Schaden, que afirma que “Ehrenreich não era nada otimista quanto ao destino dos silvícolas brasileiros, mormente em face do que vira entre os Botocudos de Espírito Santo, do grau de seu depauperamento físico e de sua desmoralização pelo convívio com os brancos. (1964, p.85)
A fotografia constituía-se como um referente indicial, um documento histórico de algo que, na visão do etnólogo, estaria fadado a desaparecer.
Paul Ehrenreich estudou também grupo indígenas mexicanos e norte-americanos, em duas ocasiões diferentes, em 1898 e 1906. Em 1907 torna-se membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Suas pesquisas possuem grande importância para a formação da etnologia e da linguística sul-americana, abordando temas embrionários como a mitologia indígena e a etnomusicologia. Ehrenreich foi professor livre-docente de antropologia pela Universidade de Berlim até falecer, em 1914, aos 59 anos.
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* Botocudo ou Aimoré é uma denominação que os colonizadores portugueses utilizavam para se referir ao conjunto de índios que usavam botoques labiais e auriculares. Portanto, esta denominação, muito comum no vocabulário utilizado pelos fotógrafos do séc. XIX, na realidade se refere à grupos étnicos bastante diversos, como os Kaingang, Xokleng, Krenak e Xetá (TACCA, 2011).
REFERÊNCIAS
– EHRENREICH, Paul. Anthropologische Studien über die Urbewohner Brasiliens vornehmlich der staaten Matto Grosso, Goyaz uns Amazonas (Purus-Gebiet) – nach eigenen aufnahmen und beobachtungen in den jahren 1887 bis 1889. Berlin: Braunschweig, 1897
– KARP VASQUEZ, Pedro. Fotógrafos alemães no Brasil do século XIX / Deutsche Fotografen des 19. Jahrhunderts in Brasilien. São Paulo: Metalivros, 2000.
– MEIRELLES FILHO, João. Grandes expedições à Amazônia brasileira. São Paulo: Metalivros, 2009.
– TACCA, Fernando de. “O índio na fotografia brasileira: incursões sobre a imagem e o meio”. História, ciências, saúde – Manguinhos – Vol. 18, nº 1, p.191-223. Rio de Janeiro., 2011 (disponível aqui)
– SCHADEN, Egon. “A obra científica de Paul Ehrenreich”. In: Revista de Antropologia. São Paulo, USP. Vol.12, no. 1/2, 83-86, 1964.
– VALENTIN, Andreas. A fotografia amazônica de George Huebner. Rio de Janeiro: Nau Editora, 2012.
ACERVO
– Coleção do Institut für Länderkunde – Leipizig
– Instituto Moreira Salles
– Biblioteca Nacional