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E. Thiesson


As primeiras fotografias de índios brasileiros



As informações sobre a vida e o trabalho do daguerreotipista francês E. Thiesson são imprecisas e desencontradas, desconhecendo-se inclusive o seu prenome. Chefiou uma expedição à Amazônia nos primeiros anos da década de 1840, e posteriormente estabeleceu um estúdio em Lisboa, onde realizou retratos de diversos africanos residentes na cidade.

São de sua autoria os cinco daguerreótipos, datados de 1844, de dois índios botocudo* trazidos para a França na condição de “cobaias” para experimentos de medição, comparação e catalogação – procedimentos próprios da ciência positivista e evolucionista daquela época. Tais fotografias, utilizadas como instrumento de estudo antropométrico, mostram os índios da cintura para cima, com o dorso nu e as pernas cobertas, em poses frontais e de perfil.

Thiesson omitiu o nome e qualquer outro detalhe pessoal dos fotografados, buscando acentuar a objetividade científica de seus retratos. Sabe-se que estes mesmos índios já estavam em Paris desde 1843 onde, antes de serem fotografados, adquiriram certa notoriedade por terem sido o foco de um caloroso debate na Academia de Paris.

Produzidas em um estúdio, estas imagens de uma mulher e de um jovem botocudo são provavelmente as primeiras fotografias de índios brasileiros feitas na história, carregando consigo um grande valor, tanto para a história da fotografia, quanto para a antropologia visual.

Segundo o historiador Marco Morel:

Mais do que registro neutro ou ‘real’, esses daguerreótipos trazem uma carga civilizatória. Mesmo que a intenção dos detentores das imagens fosse fazer estudos ‘raciais’, as expressões e condições de vida desses índios, registradas pelas fotografias, são também significativas […]. À sua maneira, esses índios posaram, responderam com seu corpo a tudo aquilo que não aparecia nas suas vozes: elaboraram seu discurso, contaram sua história, ainda que sem palavras. (2002, p. 3)

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* Botocudo ou Aimoré é uma denominação que os colonizadores portugueses utilizavam para se referir ao conjunto de índios que usavam botoques labiais e auriculares. Portanto, esta denominação, muito comum no vocabulário utilizado pelos fotógrafos do séc. XIX, na realidade se refere à grupos étnicos bastante diversos, como os Kaingang, Xokleng, Krenak e Xetá (TACCA, 2011).

REFERÊNCIAS

KOSSOY, Boris. Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2002

MOREL, Marco. “Imagens aprisionadas e resistência indígena: os daguerreótipos de 1844”. Revista Studium 10. Campinas: Unicamp, 2002 (disponível aqui)

– ____________. “Cinco imagens e múltiplos olhares: “descobertas” sobre os índios do Brasil e a fotografia do século XIX”. História, ciência, saúde – Vol. 8, p. 1039-1058. Rio de Janeiro, 2001 (disponível aqui)

MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de. Estou aqui. Sempre estive. Sempre estarei. Indígenas do Brasil. Suas imagens (1505-1955). São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2012

TACCA, Fernando de. “O índio na fotografia brasileira: incursões sobre a imagem e o meio”. História, ciências, saúde – Manguinhos – Vol. 18, nº 1, p.191-223. Rio de Janeiro., 2011 (disponível aqui)

ACERVO

– Musée du Quai Branly (França)